O professor do Programa de Pós-graduação em Ciência Ambiental do Instituto de Energia e Ambiente da Universidade de São Paulo (IEE-USP), Pedro Luiz Côrtes, criticou a intenção do governo do estado de São Paulo de privatizar a Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp). De acordo com o pesquisador, a administração estadual não apresentou razões que justifiquem uma eventual decisão pela privatização da empresa.
O especialista ressaltou que a Sabesp é uma empresa bem administrada, com grande capacidade técnica, não dependente de recursos do governo do estado, e capaz de financiar suas obras com recursos próprios ou captando de instituições financeiras. “Cabe ao governo do estado explicar os motivos que o levam a pensar numa privatização”, disse Cortês, que também é professor do Programa de Pós-Graduação em Ciências e Tecnologia do Ambiente da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto, em Portugal .
Ele destacou que a administração estadual defende que a desestatização da Sabesp irá melhorar a eficiência da empresa, mas ressalta que o governo não apresentou quais índices serviriam para medir a melhora da eficiência da Sabesp.
“Em momento algum foi explicado quais os reais benefícios que uma eventual privatização poderia gerar para a população, seja em relação às práticas tarifárias, seja em relação à melhoria da qualidade de saneamento para as populações que moram na periferia das grandes cidades, seja no aumento da taxa de tratamento do esgoto”, afirmou.
Na última semana, o governo paulista informou que planeja iniciar, em 2024, as audiências e consultas públicas para a privatização da Sabesp. A administração estadual não confirmou, no entanto, se o leilão de privatização, ou a oferta de ações da empresa, irá ocorrer já no ano que vem.
“Toma-se que a privatização como se fosse um dogma a ser seguido e, portanto, a privatização sempre é boa, sempre é benéfica, mas, na verdade, não se explica qual o benefício que isso poderia gerar para população. Então, eu não vejo nenhuma justificativa para apoiar, ou subsidiar, uma decisão desse tipo, ou a tendência de que uma decisão desse tipo venha a ser tomada”, reitera o professor da USP.
Mudanças climáticas
De acordo com o professor, o modelo atual de abastecimento de água na região metropolitana de São Paulo (RMSP) prevê a captação de água da chuva, a manutenção da água em grandes reservatórios ou represas e, depois, o tratamento e a distribuição. Côrtes ressalva, no entanto, que, desde o final do século passado, o padrão de chuvas na região se alterou. Os períodos de estiagem e chuvosos passaram a ser mais severos e duradouros.
“Essas oscilações não são boas para um sistema desse tipo porque nós não conseguimos ampliar, de maneira significativa, a capacidade de reserva dessa água da chuva, porque isso implicaria, ou no desenvolvimento de novos reservatórios, ou na ampliação dos reservatórios já existentes”.
Cortês afirma que, diante das mudanças climáticas, é muito mais urgente uma discussão sobre o modelo de distribuição de água a ser utilizado nos próximos anos do que sobre a privatização da Sabesp, companhia que opera o Sistema Cantareira, o maior produtor de água da RMSP e que abastece, aproximadamente, 46% da população da área.
“Nós precisamos pensar em um sistema de distribuição que esteja em um nível de resiliência maior face as mudanças climáticas. O sistema atual, por melhor que seja a administração da Sabesp, os esforços que ela vem empreendendo, não tem sido suficiente para melhorar a segurança hídrica da região metropolitana de São Paulo. Isso seria muito mais urgente do que considerar uma eventual privatização”, destacou.
Com a privatização da Sabesp, o pesquisador afirma que o modelo atual, de captação, tratamento e distribuição, corre o risco de ficar estagnado. “Uma vez privatizado, o sistema será o que está aí. E eu questiono: a cargo de quem ficará avaliar, daqui a 10 anos, por exemplo, se esse sistema está adequado ou não? Quais os investimentos seriam necessários para melhorar a segurança hídrica?”, questionou.
“Discutir o modelo não significa abandonar o modelo existente; mas, na verdade, buscar alternativas para reduzir a nossa dependência do ciclo de chuvas, porque o ciclo de chuva já não se comporta mais, como se comportava no século passado.”
Fonte: Agência Brasil