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Sintaema: desafios, conquistas e a batalha contínua pela água como direito

Em 2025, o Sindicato dos Trabalhadores em Água, Esgoto e Meio Ambiente de São Paulo (Sintaema) celebra meio século de existência. Uma trajetória marcada por lutas incansáveis, conquistas históricas e a defesa intransigente dos direitos da categoria e do saneamento público como bem essencial à vida e não como mercadoria. Ao longo dessas cinco décadas, o Sintaema consolidou-se como uma voz potente no cenário sindical brasileiro, enfrentando desafios monumentais como as investidas neoliberais pela privatização do setor, a luta contra a precarização das condições de trabalho e, mais recentemente, os impactos de uma pandemia global que exigiu organização, reflexão e adaptação para manter de pé o Sindicato e proteger os trabalhadores e trabalhadoras do setor.

Neste marco histórico, conversamos com José Antônio Faggian, presidente do Sindicato. Ele reflete sobre o legado do Sintaema, os momentos mais marcantes dessa jornada, as vitórias alcançadas, os desafios atuais na defesa da água como direito e não mercadoria, e os caminhos futuros para um Sindicato que se mantém combativo e essencial na construção de um futuro mais justo para os trabalhadores e para a sociedade. Confira a entrevista:

O Sintaema completa 50 anos em 2025. O que representa essa trajetória para você e para a classe trabalhadora da água, esgoto e meio ambiente?

José Antônio Faggian: Completar 50 anos é um marco extraordinário. Representa meio século de resistência, lutas e conquistas dos trabalhadores e trabalhadoras que garantem serviços essenciais como água, esgoto e preservação ambiental. Para mim, é uma honra liderar o Sintaema nesse momento, pois minha trajetória pessoal está profundamente ligada à do Sindicato — foi aqui que me formei como militante político e do setor de saneamento.

Essa história simboliza a força da união da nossa categoria, que mesmo diante de tantos desafios, sempre soube se organizar e lutar por direitos, dignidade e reconhecimento. É a prova de que, juntos, construímos vitórias e defendemos o patrimônio público e os interesses da classe trabalhadora.

O Sintaema foi — e segue sendo — peça chave em todas as lutas, não só por direitos trabalhistas, mas também em defesa do saneamento público e de um projeto de país mais justo.

Quais momentos históricos você destacaria como marcos da atuação do Sindicato? E quais foram as principais conquistas de direitos para a base nesses 50 anos?

Faggian: Nestes 50 anos, muitos momentos marcaram a trajetória do Sintaema. Destaco as grandes greves da categoria por melhores condições de trabalho e contra as tentativas de privatização. Lutas como a derrota do “Parceiro Estratégico” e o fim do “Salário Regional” na Sabesp foram vitórias emblemáticas. Mesmo com a recente e lamentável privatização da Sabesp, é importante lembrar que a resistência histórica do Sintaema adiou esse processo por décadas e barrou diversas tentativas de entrega do saneamento à iniciativa privada.

Desde que entrei na empresa, em 1998, vivi o avanço do neoliberalismo e os ataques aos direitos dos trabalhadores, com tentativas de abertura de capital e privatização. Foi um período duro, mas também de fortalecimento da organização sindical e aprendizado coletivo.

Em termos de conquistas, avançamos muito: reposições salariais acima da inflação, ampliação de benefícios como plano de saúde, auxílio-creche, vale-refeição e protocolos de proteção à saúde e à dignidade no trabalho. Cada acordo coletivo representa uma vitória da mobilização e da luta sindical em defesa dos trabalhadores e do saneamento público.

Em tempos de ataques aos direitos trabalhistas, com reformas que precarizam as relações de trabalho, como o Sintaema tem atuado para garantir condições dignas, salários justos e valorização profissional?

Faggian: Desde o golpe de 2016, vivemos um período de intensos ataques aos direitos trabalhistas, com reformas que ampliaram a terceirização e precarizaram ainda mais o trabalho. O Sintaema tem atuado firmemente para enfrentar essa ofensiva. Nas negociações coletivas, buscamos não só a reposição das perdas inflacionárias, mas também ganhos reais e a preservação de cláusulas sociais que protegem a categoria. Defendemos cada acordo com seriedade e mobilização.

Também fortalecemos a organização nos locais de trabalho, com diálogo constante por meio das setoriais, o que nos permite mobilizar a base e responder às demandas concretas. No campo político, atuamos para barrar projetos que atacam nossos direitos e contamos com aliados como os deputados Orlando Silva e Leci Brandão, comprometidos com a classe trabalhadora.

A valorização profissional passa por mais concursos públicos, especialmente na CETESB e na Fundação Florestal, e pela inclusão de cláusulas que protejam a saúde mental dos trabalhadores. Nossa atuação une luta concreta e visão estratégica: defender direitos é também disputar os rumos do país.

Hoje o Sintaema é reconhecido como uma referência no mundo sindical brasileiro. A que você atribui esse reconhecimento ao Sindicato?

Faggian: Acredito que o reconhecimento que o Sintaema tem hoje é resultado direto da nossa trajetória de coerência, combatividade e compromisso com a classe trabalhadora ao longo dessas cinco décadas. Sempre estivemos presentes na defesa intransigente dos interesses da categoria e do patrimônio público, mesmo diante de conjunturas difíceis e adversas. Nunca nos limitamos às pautas corporativas — estivemos e seguimos engajados nas grandes lutas do povo brasileiro: pela democracia, pela soberania nacional, pelos direitos humanos e por um projeto de desenvolvimento que tenha o povo como prioridade. Essa trajetória é guiada por uma visão classista, que entende o sindicato não apenas como instrumento de defesa econômica e trabalhista, mas como sujeito político ativo na transformação da sociedade. Formamos lideranças comprometidas com essa missão, politizadas, com atuação concreta em diferentes espaços: nos comitês de bacia, nos movimentos sociais, na política institucional e nos territórios. Temos uma base estadual forte e capilar, presente em diversas regiões, o que amplia nosso alcance e credibilidade. Isso faz com que o nome Sintaema seja reconhecido não apenas como defensor dos trabalhadores e trabalhadoras do setor de saneamento e meio ambiente, mas como uma referência na defesa do saneamento como direito, da preservação ambiental e dos interesses populares. Buscamos constantemente fortalecer nossa estrutura organizativa, investir na comunicação, ampliar a capacidade de negociação e garantir a participação ativa da base. A transparência na gestão e o compromisso com os princípios que nos fundam são parte do que nos faz respeitados. É esse conjunto — coerência, base mobilizada, visão estratégica e compromisso com o povo — que constrói, dia após dia, o respeito e a admiração que o Sintaema conquistou ao longo de 50 anos de lutas.

Hoje, muitos tratam a água como mercadoria. Como o Sindicato atua na defesa da água como direito e bem público, e quais os riscos dessa mercantilização, especialmente para a população mais pobre?

Faggian: A defesa da água como direito humano fundamental é uma luta histórica e central para o Sintaema. Entendemos que ela não pode, em hipótese alguma, ser tratada como mercadoria, pois está diretamente ligada à vida — seja para o consumo humano, para a produção de alimentos, para a saúde pública ou para o funcionamento da indústria. No entanto, a lógica do capital insiste em transformar tudo em mercadoria, e o saneamento virou um dos principais alvos desse processo, especialmente com o avanço do neoliberalismo, que busca lucrar com a infraestrutura dos países periféricos.

Diante disso, o Sintaema atua em várias frentes para combater a privatização e a mercantilização da água. Participamos de conselhos, audiências públicas e espaços institucionais para apresentar estudos técnicos, dialogar com autoridades e mobilizar a sociedade civil em defesa de uma gestão pública, eficiente e com controle social. Esse é o único caminho capaz de garantir o acesso universal à água e ao esgoto tratado. A privatização, ao contrário, representa um enorme retrocesso, como já vimos em diversas experiências no Brasil e no mundo.

Quando a gestão da água passa para empresas privadas, o foco deixa de ser o interesse público e passa a ser o lucro dos acionistas. Isso se traduz em aumento de tarifas, exclusão das populações mais pobres, precarização dos serviços e ausência de investimentos em regiões menos rentáveis. O caso da Sabesp é emblemático: além da privatização da companhia, o governo enfraqueceu a agência reguladora (Arsesp) e repassou até mesmo a gestão dos mananciais da Grande São Paulo à iniciativa privada, com a venda da EMAE. Ou seja, entregaram todo o ciclo da água ao setor privado.

O debate ambiental ganhou novas dimensões com a crise climática. O que está em jogo quando falamos de política ambiental em um país como o Brasil, e qual o papel do Sintaema nessa discussão?

Faggian: O futuro do Brasil e do planeta está em jogo. Com sua rica biodiversidade e biomas fundamentais como a Amazônia, o país tem uma enorme responsabilidade na crise climática. Proteger o meio ambiente significa preservar florestas e rios, garantir os direitos dos povos indígenas e tradicionais, e promover um modelo de desenvolvimento sustentável, baseado na agroecologia e em energias limpas.

Para os trabalhadores do saneamento, a defesa ambiental é também uma questão de saúde pública e qualidade de vida. Preservar os mananciais é essencial para o abastecimento de água. Por isso, o Sintaema se soma às lutas ambientais e sociais por justiça, soberania e um futuro saudável para todos. Não há saneamento sem meio ambiente, nem futuro sem planeta.