Estudo comprova o que já sentimos no cenário nacional que o deficit educacional cria “armadilha da pobreza”. Quem mostra isso é o estudo de pesquisadores da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade de Ribeirão Preto (FEA-RP) da USP. E os últimos achados da equipe apontam a educação ruim como um dos principais fatores a perpetuar a pobreza.
Nesse estudo, se decidiram a pesquisar o cenário da pobreza brasileira a partir de uma perspectiva macroeconômica, relacionando dados econômicos regionais com as notas do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica divulgadas em 2015. Realizaram então dois ensaios para analisar mais profundamente os impactos da pobreza no desenvolvimento e formação do capital humano, ou seja, na qualidade da educação que uma pessoa recebe ao longo da vida. O objetivo, comentam, foi compreender os efeitos da pobreza no processo do desenvolvimento econômico.
No primeiro ensaio, avaliaram os efeitos da pobreza na qualidade da educação e observaram, por exemplo, que o aumento de um ponto percentual na incidência de pobreza é capaz de reduzir em 1,2% a performance escolar dos estudantes do quinto ano do ensino fundamental. Nos alunos do nono ano, esse efeito é de 1,1%.
Para o segundo ensaio, os pesquisadores utilizaram a tese de convergência da pobreza do economista australiano Martin Ravallion, com base no artigo Por que não vemos a convergência da pobreza?, para avaliar as razões da manutenção da pobreza em determinados municípios do País. E os resultados sugerem que a própria pobreza afeta negativamente o crescimento da renda per capita local, desacelerando o processo de redução da pobreza.
Segundo o professor Luciano Nakabashi, da FEA-RP e orientador da pesquisa, “todos esses elementos fazem com que a criança tenha um desempenho pior, um salário menor, com dificuldades financeiras, e os filhos dela vão passar por dificuldades semelhantes. Isso acaba caracterizando uma armadilha da pobreza.”
Pobreza compromete aproveitamento econômico
Para o autor da pesquisa, Nicolas Volgarine Scaraboto, esse efeito da pobreza acontece pela dificuldade do município em “aprimorar seu nível educacional”. Este cenário se alinha ao observado com os resultados da literatura médica, sugerindo “que crianças em situação de pobreza têm dificuldade de aprendizado e dificuldade com habilidades cognitivas”, acrescenta o pesquisador.
Nicolas afirma que trata-se de um efeito macroeconômico relevante no qual as crianças pobres possuem maior dificuldade em aprimorar o seu nível de capital humano. Esse fator, alinhado à incidência da pobreza que dificulta o crescimento econômico dos municípios, também dificulta o aproveitamento da população pobre em relação ao crescimento econômico, gerando uma desigualdade interna no próprio município.
Nakabashi cita Ravallion, para quem “os países com mais pobreza crescem menos”, na análise do segundo ensaio para informar que as regiões brasileiras com maior pobreza têm mais dificuldade na acumulação de capital humano, ou seja, de educação. As crianças aprendem menos e, consequentemente, a força de trabalho terá uma produtividade menor, conta o professor.
Ao contextualizar a situação, Nakabashi diz que as crianças que nascem e crescem nesse ambiente estão mais suscetíveis a uma série de fatores que afetam o desempenho escolar, e ainda soma a qualidade escolar do ensino público, que tende a ser mais defasado.
A combinação dos efeitos causados pelo ambiente familiar e escolar, segundo o professor, afeta o desempenho socioemocional da criança, que prejudica o aprendizado educacional. Dentro de sala, uma criança que frequenta um ambiente onde as outras crianças possuem um bom desempenho tende a também ter um bom desempenho, influenciada pelos colegas, cenário não visto na maioria das escolas públicas, defende Nakabashi.
Os resultados do estudo Dois ensaios sobre pobreza e desenvolvimento econômico nos municípios brasileiros fazem parte da dissertação de mestrado de Nicolas Volgarine Scaraboto apresentada à FEA-RP em agosto de 2021.
Fonte: Jornal da CTB